CIDADE
PADRE JEOVÁ Nosso Pastor
foi embora
(*) José Edmar Gomes
Ele viu
muitas crianças serem batizadas às pressas por seu pai, antes de morrerem,
acometidas dos males da desnutrição e falta de acompanhamento médico, situação
que era comum nos 1960/70, naquele interior do Ceará esquecido pelas
autoridades.
Lá, na região
de Coreaú, num certo lugar denominado Ubaúna, seu pai era dirigente do Dia do
Senhor e sua infância foi ligada às celebrações religiosas. Sua família chegou
a morar na casa paroquial e o garoto Jeovazinho acompanhava, com certa
curiosidade, as visitas do padre para celebrações pontuais, batizados e
casamentos.
Mas, ele
nasceu mesmo foi no Saquinho. Quer dizer, num lugarejo chamado Saquinho,
distrito de Sobral, que hoje nem existe mais. Virou assentamento agrícola. Lá,
viveu até os dois anos e partiu para Ubaúna, onde a família permaneceu por mais
dez anos, antes de arriscar a vida em Santarém, no Pará, viagem de triste
lembrança, pois lá faleceu sua única irmã.
Na volta ao
Nordeste, a família estabeleceu-se em Teresina, onde seu pai, que era um misto
de agricultor sem-terra e mascate, acabou sendo acometido de malária e pediu
para voltar para o interior do Ceará.
A essa
altura, o garoto Jeovazinho - o mais velho de uma família de oito irmãos - já
estava com 14 anos e sentiu o peso da responsabilidade pela família nas costas.
Ele então resolveu estudar e trabalhar em Parnaíba, depois em Fortaleza, onde
trabalhou no comércio até os 17 anos.
Em seguida,
voltou à Teresina para concluir o ensino fundamental e prestar o serviço
militar. Já estamos em 1981 e o, agora, rapaz, Jeová Elias, resolveu mudar-se
para Brasília, trazendo na mala muitos sonhos e poucos pertences.
Fuga da miséria?
Aqui,
estabeleceu-se humildemente no Núcleo Bandeirante e, como os primeiros
candangos, deu duro na construção civil. Aos finais de semana, participava da
catequese da Legião de Maria e de visitas aos pobres.
Numa dessas
visitas, Jeová lembrou-se das aulas de um professor que era padre. Foi a
primeira vez que pensou em ser padre, mas logo abandonou a ideia, pois lhe veio
a dúvida: será que aquela vontade não era apenas uma fuga da miséria em que
vivia?
Mas tal
inquietação passou a persegui-lo e ele pensava nas rupturas que teria que
fazer. Afinal, ele tinha deixado até uma namoradinha no Nordeste, gostava de
forró e tinha muitos amigos, além dos dois irmãos e de seu pai que já moravam
com ele aqui.
Após três
anos, ele finalmente decidiu entrar para o seminário, mas o destino conspirou
contra. De repente, sua mãe e mais outros três irmãos bateram à sua porta.
Vieram morar com ele, também.
E agora?
“Oito pessoas dentro uma kitnet era o maior sufoco. Eu era o mais velhos dos
irmãos e aquilo me preocupava muito. Adiei a entrada no seminário”, revela o
hoje padre Jeová.
Diante de
tal situação, o negócio era trabalhar muito. E o nosso Jeová pegou pesado na
construção civil, na cozinha de restaurantes, na medição de água da Caesb e,
finalmente, no Banco Geral do Comércio, onde o salário e as condições de
trabalho eram melhores.
Mas, como
Deus escreve certo em qualquer circunstância, um dia o nosso bom Jeová
encontrou um colega com quem fizera o discernimento vocacional no Seminário
Menor e este o provocou: - Jeová, tu não te decidistes, ainda? As aulas do
seminário vão começar semana que vem”!
Pão e leite
Aquelas
palavras calaram no seu interior como um sopro divino. Pediu contas do banco no
mesmo dia, mesmo sem saber se o seminário o aceitaria. Aceitou, imediatamente.
Mas o banco ainda o reteve por algum tempo.
“Eu saia do
seminário e ia para o banco sem almoçar. Quase morri de fome (ri,
gostosamente). Só comia alguma coisa às três da tarde. O pão com leite que o
banco oferecia. Eu caia matando. Tanto é que, hoje, tenho dificuldade de comer
esses alimentos. Empapucei”, relembra o padre.
Ele entrou
para o seminário em 1985. Cursou três anos de filosofia e quatro de teologia.
Ordenou-se em 1991, numa cerimônia na Catedral Metropolitana de Brasília e
celebrou sua primeira missa no Núcleo Bandeirante.
Nesta época,
fevereiro de 1992, Samambaia estava nascendo e o bispo auxiliar de Brasília,
dom Alberto Taveira, o designou vigário do lugar. Antes de assumir, no entanto,
o novo padre foi gozar merecidas férias no Ceará. Quando voltou, seu destino
passou a ser a nova paróquia da Santíssima Trindade, em Ceilândia Norte.
Em
Ceilândia, conviveu com o padre Antônio, um holandês, considerado profeta que
marcou a história da Cidade, de quem tem ótimas lembranças.
“Fui o
primeiro pároco de uma igreja comprometida com os pobres, uma caminhada linda.
Aprendi muito. Os fieis é que sofreram com minha falta de experiência, meus
condicionamentos e meus ranços intelectuais”, reconhece o padre Jeová.
Santas Missões
Em julho de
1993, no entanto, o bispo auxiliar o enviou para Sobradinho para suceder o
padre Marconi. Tomou posse dia 12 de setembro de 1994 e passou 23 anos e quatro
meses à frente da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, da Quadra 8. Aqui, ele viu seus pais morrerem e afeiçoou à
comunidade como sua própria família; realizou as Santas Missões Populares;
edificou uma nova igreja e celebrou os 50 anos da paróquia.
Na noite
chuvosa do domingo, 15 de janeiro, sob imensa comoção dos fiéis e dele próprio,
o padre Jeová celebrou missa de sua despedida de Sobradinho. Ele, seguindo a
inquietação que há muito o perseguia, resolveu buscar outro mar. E rumou sua
barca para a Colômbia, onde foi
cursar mestrado em Teologia Pastoral, no Centro Bíblico Teológico Pastoral para
América Latina e Caribe.
Antes de
partir, porém, e já muito cansado pelas atribuições da viagem, gentilmente
recebeu o editor do Folha da Serra, José Edmar Gomes, para a seguinte entrevista:
Padre Jeová, como foi sua adaptação
em Sobradinho?
- Encontre
um povo choroso, saudoso do padre Marconi, que tinha muito carisma. No dia da
posse, uma senhora me abraçou e me disse que esperava que eu fosse igual a ele
(risos).
Tive bons e
maus momentos aqui. A morte da minha mãe me abalou muito. Talvez por eu ser
celibatário. Quem é casado, tem família, tem uma referência...tivessem mais
facilidade para lidar com a morte...
- A morte é
terrível. Eu pensava que, por lidar com a morte dos outros, tivesse preparado
para a morte dos meus pais. Mas não estava. Acho que sofri mais que os outros.
O senhor acha que Brasília
concretizou o sonho de Dom Bosco?
Essa utopia
não se concretizou ainda. Agente persegue esse sonho, mas ainda não o
alcançamos. Brasília é campeã em desigualdade social, apesar do seu espírito
místico. Parece que todas as religiões querem estar aqui. Eu vivi na Ceilândia
um ano e meio e vi muita discrepância e parece que hoje tá pior. As pessoas nem
parecem humanas. É muita violência.
Mas a utopia não é um sonho que as
pessoas perseguem como se fosse a esperança?
A utopia é
um sonho que agente persegue esperançoso de alcançá-lo. Um sonho que vai se
atualizando. Brasília tem muita coisa boa e se caracteriza pela multiplicidade
religiosa, mas o desnível social e a violência são exorbitantes. Isso na cidade
de maior renda per capta do Brasil. Eu
amo esta cidade, foi onde vivi mais tempo, mas ela não atingiu a utopia de Dom
Bosco. Ainda tem muitos desafios pela frente.
E Sobradinho? A Cidade Serrana tem
alguma coisa de especial para o senhor?
Sobradinho é
especial. Aqui tem-se um clima familiar, comunitário. As pessoas são
acolhedoras, principalmente aqui nesta paróquia. Quando cheguei foi difícil.
Mas, aos poucos, fui cativando as pessoas.
Hoje, sou
muito grato a esta cidade querida, onde
eu ajudei a construir um pedacinho de sua história. Quando cheguei, Sobradinho
II estava nascendo e o Setor de Mansões tinha apenas 500 casas, não tinha a
presença da igreja, ainda. Fizemos senso e visitas, inclusive na zona rural.
Que mais Sobradinho tem de especial?
- Quem passa
por aqui não a esquece. Padres e seminaristas, mesmo ficando pouco tempo, não
esquece a cidade e as pessoas. Gente de Minas, Mato Grosso e outros estados,
que passou por aqui, quando voltam a Brasília, preferem ficar em Sobradinho que
em outros lugares.
Sua decisão de ir para a Colômbia foi
pessoal ou ordem superior?
- Foi um
processo construído junto. É uma interpelação de Deus que me move e me inquieta
e que eu venho tentando clarear na oração, na conversa com os colegas e com o
bispo. Não é uma decisão que eu estou tomando de repente. Já faz alguns anos
que estou neste processo, que eu chamo de discernimento vocacional. Parece que
eu vivi a mesma sensação de quando tentei entrar par o seminário: senti-me
inquieto, inseguro e sem clareza. Quase um adolescente. Achava que já estava
aqui há muitos anos, estava me repetindo e poderia fazer algo diferente. Mas a
questão era o que fazer.
O que o senhor fez, então?
Uma certeza
eu tinha. Não ia sair daqui por sair, após mais de 23 anos, com todo o cansaço
do ministério, após ser vigário episcopal por dez anos, participar do governo
da arquidiocese, dos seus diversos
conselhos, conhecer a realidade de Brasília e de suas paróquias. Eu tinha uma
inquietação que me chamava para fazer algo diferente. Deus me chamava e a
consciência missionária me ajudou a desapegar.
Nesta época, o senhor estava meio
confuso, ainda?
Foi um
processo sofrido. Só sabia o que não queria. Há um ano, porém, encontrei-me com
o arcebispo e, depois do jubileu da paróquia, conversei com a comunidade e
tomei a decisão, sem saber ainda para aonde ia. Mas, em outubro do ano passado,
decidi com o arcebispo que iria fazer um mestrado em Teologia Pastoral, no
Centro Bíblico Teológico Pastoral para América Latina e Caribe (Cebitepal –
cebitepalencontacto@celam.org), que é ligado ao Conselho Episcopal
Latinoamericano (Celam), em Bogotá, na Colômbia.
Por que na Colômbia?
Porque eu
valorizo muito a espiritualidade latino-americana e quero conhecer sua
realidade e compartilhá-la com colegas de diversas partes do mundo. O curso
prepara pastores, em convênio com a Pontifícia Universidade Bolivariana, que é
uma pontifícia universidade católica, para ajudar a pensar a igreja.
O cenário político da Colômbia e da
América Latina não o preocupa?
Não me
preocupa não, porque não é muito diferente do Brasil não. Não sinto medo de
nada, absolutamente.
O papel das Farcs e de outras
organizações guerrilheiras que ainda atuam na América Latina, tem algum
fundamento social, nos dias de hoje?
Eu não
acompanho o assunto e não posso te dar uma resposta definitiva. Mas acho que
algumas coisas nascem como um grito de resistência à Injustiça. Talvez as
pessoas radicalizam em virtude do desrespeito. O Estado também comete
injustiça, mas parece que o presidente da Colômbia tem lutado para melhorar a
realidade. Às vezes, o Estado não faz seu papel e contribui para o surgimento
desses grupos. A igreja também poderia ter evitado algumas coisas se tivesse
sido mais cuidadosa.
Os últimos governos de esquerda da
América Latina contribuíram para a evolução do continente?
Acho que
contribuíram bastante. Fui recentemente ao Ceará e falei pro pessoal que,
quando morava lá, tinha que carregar água e lenha porque não tinha água, nem
energia em casa. A escola era só até à 5ª série, não tinha posto médico... Fui
crítico dos programas, mas eles fazem a diferença, diante das grandes
dificuldades. Visitei uma família com nove filhos, na periferia de Fortaleza,
que depende dessa assistência, mesmo o pai trabalhando com a venda de
vassouras. Eles recebiam R$ 800,00 e, de repente, cortaram para R$ 400,00 e
eles ficaram sem água e sem luz.
Então o senhor acha que as diversas
bolsas que o governo distribui são relevantes?
São, sim,
principalmente para a educação. Hoje muita gente do interior tem curso
superior. Se tivesse essa oportunidade, na minha época, talvez não estivesse
aqui, por que eu amava o interior, mas tinha o anseio de estudar e ter uma vida
digna. Hoje, o que as pessoas conseguem no interior, era impensável na minha
época.
Então, os
governos ditos de esquerda melhoram o continente, ainda que haja os populistas
que impõem até o culto à personalidade, como na Venezuela?
O populismo
não tem fronteiras, tanto na direita, como na esquerda.
Vamos falar sobre a situação da
igreja no mundo. O papa Francisco tem pedido orações para ele. Ele corre algum perigo, assim como São João
Paulo II?
Todos nós
corremos perigo. Viver é um risco. As grandes autoridades mundiais, como o
papa, correm perigo, sobretudo, quando contraria certos interesses. João Paulo
II, que tinha postura menos ousada que Francisco, sofreu atentado a tiros. O
padre, Jacques Hamel, de 84 anos, foi degolado por fanáticos políticos quando
celebrava missa na igreja de Saint- Étienne du Rouvray, na Normandia, na
França, em julho passado. Eu corro risco também. Alguém já veio aqui (igreja da
Quadra 8) para me matar.
Como assim? Explica melhor esse
episódio...
Eu vivi dois
sustos aqui. O primeiro eu não estava, mas um homem veio aqui para me matar,
dizendo que eu era FHC (risos). Alguém
tentou contê-lo e ele agrediu essa pessoa, derrubou os castiçais e cuspiu no
altar. De outra vez, numa missa, também na igreja antiga, na procissão de
entrada, um jovem se postou atrás de mim com uma faca. Eu não o vi. Mas quando
fiz o reverenciamento, ouvi o barulho de um objeto caindo. Ele jogou a faca em
cima do altar. Acho que ele não tinha a intenção de me matar, mas imagina a
cena...
Como o senhor vê a revelação do
terceiro segredo de Fátima. Ele não veio tarde? Se São João Paulo II o tivesse
revelado antes, não teria evitado o atentado que sofreu?
A igreja é
sempre muito cuidadosa com revelações particulares e não as coloca como dogma
de fé. Como coisa que os católicos sejam obrigados a aderir. Talvez, por isso,
os papas e a igreja em si não se preocupem muito com tais revelações. Tem-se
que ter muito cuidado para saber se essas revelações não são apenas frutos da
imaginação, valorizar a mensagem com cuidado
para separar os frutos da imaginação da realidade. São milhões de
pessoas envolvidas e as coisas devem ser sérias e equilibradas. Claro que
Fátima é uma coisa séria, dois papas já foram lá. Mas, para a igreja, o
importante é o Evangelho, o que Jesus Cristo falou. Se essas coisas reforçarem
o Evangelho de Cristo, Deus seja louvado!
Mas se forem contradições, não devem ser acolhidas.
Nossa Senhora aparece no Brasil e no
mundo, com frequência, fazendo revelações e pedindo para as pessoas recitarem o
Rosário. No entanto, a igreja parece não valorizar tais episódios. Por que?
São mais de
dois mil anos de história e, neste
período, já ocorreram muitos equívocos. Por isso, a igreja é muito criteriosa
ao fazer certas afirmações. Num certo período, apareceram pessoas dizendo que
tinham recebido uma gota de leite do seio de Nossa Senhora; uma pena da asa do
anjo da guarda, etc. Tudo isso faz com que a igreja seja, cada vez, mais
cuidadosa.
Mas, em Fátima, na última aparição,
cerca de 40 mil pessoas viram o sol se despencar do céu e entraram em pânico.
Existem fotos e relatos mil. Isso não são provas definitivas?
Por isso se
valoriza tanto Fátima. Os santuários marianos têm valor pela mensagem do
Evangelho. Nossa Senhora tem predileção pelos pequenos. Em Guadalupe, apareceu
a um índio; Em A parecida, a pescadores;
em Fátima, aos pastorzinhos... Essa mensagem é mais importante do que
muita coisa que se cria em torno do fato. Reforçar a mensagem de Cristo, da
paz, da solidariedade e de um mundo mais bonito para todos deve ser a nossa
preocupação.
O senhor já viu falar em Nossa
Senhora do Arco-íris?
Já.
Sabe onde Ela se manifesta?
Dizem que é
aqui no Horto Florestal de Sobradinho.
O senhor nunca teve vontade de
conhecer esse fenômeno?
Eu conheço
porque as pessoas me falam a respeito. Sou um pouco preocupado com isso, apesar
de respeitar o que as pessoas pensam. Gente da comunidade já apresentou
problema de saúde, porque olhou diretamente para o sol, lá na gruta das ditas
aparições, e tiveram problemas na retina. Então a igreja é prudente por esse
motivo também.
Os pentecostais usam a TV para
mostrar milagres e curas e têm atraído milhões de seguidores. Qual a visão da
igreja católica sobre isso?
A igreja
católica tem muito respeito por quem tem uma expressão de fé diferente. Mas
pensa diferente e acha algumas coisas um equívoco. Eu, particularmente, com
relação aos neopentecostais, acho que pode ser fruto da pós-modernidade,
tendente ao afetivo, ao individualismo, à prosperidade, à promessa de riqueza,
ao individualismo moderno e até egoísta, porque nem sempre as pessoas vivem a
experiência comunitária, como queria Jesus.
Não basta eu
ter experiência individual, Jesus pediu às pessoas para viver em comunidade,
mas nem sempre isso acontece. As pessoas
não podem pensar em só tirar proveito pessoal. Não dá pra ficar rico em um
passe de mágica. Antigamente havia a
doutrina da retribuição, que dizia que quem era bom prosperaria e quem era ruim
seria punido. Hoje, temos a teologia da prosperidade que defende a ideia de
que, se você der ofertas e fizer sacrifícios, prosperará. Mas, nem sempre, você
pode dar ofertas... Deus ama o pecador, os mais pobres... Algumas pessoas,
talvez por egoísmo ou insegurança social e econômica, por sofrimento, buscam
uma boia para se agarrar.
O senhor fundou as Santas Missões
Populares. Do que se trata?
São
comunidades religiosas pequenas, onde a convivência comunitária pode ajudar a
superar certos problemas. Criamos sete comunidades, em Sobradinho, onde as
pessoas se encontram semanalmente e veem quem está sofrendo ou está com alguma
dificuldade. Cada uma tem um coordenador, um ministro da palavra, que estabelecem
diálogo respeitoso e ajudam as pessoas a caminharem, mesmo que elas vivam
outras experiências, que não queiram coisas erradas, mas um mundo bonito e
justo.
A Renovação Carismática da Igreja
Católica, baseada nos dons concedidos pelo Espírito Santo, também faz curas,
profetiza e está em franco crescimento no Brasil. Como o senhor vê esta tendência?
Os dons do
Espírito Santo são para proveito comunitário, não para proveito pessoal. Eles
trazem experiência comunitária profunda e não foi um espírito que veio sobre
uma pessoa. Os apóstolos estavam lá, na presença de Maria, e o Espírito Santo
veio para animá-los. A experiência não ficou no plano individual. Eles receberam
os dons para servir.
Certas pessoas comuns têm dons,
preveem acontecimentos... isso para o senhor não existe?
Existe, sim.
E chama-se premonição. Mas nem sempre está ligado ao sobrenatural. Hoje, a
ciência já explica algumas coisas que, outrora,
eram consideradas sobrenaturais.
Nesta linha de raciocínio, as
experiências de Alan Kardec e o próprio espiritismo são inválidos?
Eu respeito
quem crê no espiritismo, mas algumas coisas já têm explicações.
O senhor nunca viu uma pessoa
incorporar um espírito?
Já.
Presenciei um fenômeno assustador, quando trabalhava de zelador, num prédio do
Plano Piloto. Lá, uma moça apresentava
um comportamento estranho: ela dizia que via alguém e brincava com um carrinho,
como se fosse uma criança. Depois, agente viu que aquilo era um forma dela
chamar a atenção do porteiro. Não vou dizer que ela fazia aquilo
deliberadamente, ela estava com um problema.
Mas, se
Jesus expulsou demônios, e a Bíblia registra isso, é sinal que eles existem e
possuem as pessoas...
No tempo de
Jesus, algumas pessoas que se diziam
endemoniadas, muitas vezes, era fruto de epilepsia ou de uma situação
profundamente opressiva, sobretudo para as mulheres.
Mas, Jesus expulsou demônios ou não?
Aí tem que
ver qual é o conceito de demônio.
Para encerrar: após concluir o seu
curso, na Colômbia, que vai durar três anos, o senhor volta para Sobradinho?
O futuro a
Deus pertence. Eu imagino que não volto para Sobradinho, não. Não sei. Eu
fiquei 23 anos aqui. É uma experiência muito forte, mas creio que não volto
para esta paróquia, não. Tenho esperança de voltar para Brasília, mas não tenho
a menor ideia para onde irei. O papa Francisco fala em surpresas de Deus. Eu
gostaria de estar com meus pobres.
Fonte: José Edmar Gomes - Jornal Folha da Serra
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