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Presidenta ou Presidente?


O Brasil, pela primeira vez em sua história – e isso não é paráfrase da fala do Presidente Lula –, acaba de eleger a primeira mulher para presidir o País. Como tratá-la corretamente em termos gramaticais? Presidente ou Presidenta?

Do ponto de vista jurídico, o ilustre Juscelino Kubitschek, além de criar Brasília, deixou também a Lei n. 2.749, de 2 de abril de 1956, que assim dispõe, segundo a grafia da época:

Art. 1º Será invariavelmente observada a seguinte norma no emprêgo oficial de nome designativo de cargo público:

"O gênero gramatical dêsse nome, em seu natural acolhimento ao sexo do funcionário a quem se refira, tem que obedecer aos tradicionais preceitos pertinentes ao assunto e consagrados na lexeologia do idioma. Devem portanto, acompanhá-lo neste particular, se forem genèricamente variáveis, assumindo, conforme o caso, eleição masculina ou feminina, quaisquer adjetivos ou expressões pronominais sintàticamente relacionadas com o dito nome".

Logo, o assunto terá de ser resolvido por gramáticos, filólogos ou lexicólogos.

Pois bem, em termos gramaticais, os nomes portugueses ora são biformes quanto ao gênero, ora são uniformes. Os primeiros têm uma forma masculina e uma feminina decorrentes da flexão (aluno, aluna; menino, menina; gato, gata; etc.). Os segundos têm uma forma única, mas se distinguem pelo gênero do artigo usado (o artista, a artista; o colega, a colega; o remetente, a remetente; etc.). No último caso, a Nomenclatura Gramatical Brasileira manda chamar de substantivos comuns de dois gêneros.

E presidente, flexiona-se? Tem presidenta?

Lançando um olhar sobre a história da língua portuguesa, constata-se que a Academia Brasileira de Letras, desde o Pequeno Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (1943), registra presidenta, como substantivo feminino, e presidente, como substantivo masculino e também substantivo de dois gêneros (biforme).

Já os dicionários mais antigos, cujos autores certamente nunca imaginaram uma mulher na Presidência do Brasil, registram apenas presidente, como substantivo masculino, conforme pode ser conferido em Fr. Domingos Vieira (1873), Lacerda (1879) e Aulete (1881).

O J. T. da Silva Bastos (1928) registrou presidenta, mas dá como acepção apenas “mulher que preside um ato”, enquanto para presidente, como substantivo apenas masculino, dá também a acepção de “aquele que preside uma república”.

Francisco da Silveira Bueno (1966) registra presidenta com o significado de “mulher que exerce o cargo de presidente” e “a esposa do presidente”, mas o significado de “pessoa que preside a um governo, a um Estado, a uma associação” aparece apenas para a palavra presidente, como substantivo masculino. Cândido de Figueiredo (1947) e o Aurélio (2004) são da mesma opinião.

Para o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (2001), deve-se usar presidente, já que esse vocábulo é um substantivo masculino e feminino. Entretanto, o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (também de 2001) atribuiu à forma presidenta o significado de “mulher que se elege para a presidência de um país.”

Pelo critério estatístico, a forma presidente é a que deveria ser usada, já que é ela a mais recorrente nos dicionários, mas ninguém pode desconsiderar o peso lexicográfico do Houaiss, um dicionário moderno, feito por intelectuais de renome e com forte influência da história da língua portuguesa. Pelo Houaiss, então, deve-se usar presidenta.

A lexeologia, portanto, aponta soluções divergentes na escolha do gênero da palavra presidente. Se, de um lado, a tradição pende para Presidente Dilma, de outro lado a modernidade lexicológica do Houaiss pede Presidenta Dilma. Eu, particularmente, escolheria presidenta, em homenagem a todas as mulheres que construíram o caminho para que chegássemos a esse dia tão marcante em nossa história.

Deixemos, então, que Dilma escolha a forma pela qual será tratada na Presidência da República. Qualquer forma que vier a escolher, estará correta gramaticalmente.


(*)fonte blog do Paulo Tadeu - Artigo escrito por José Willemann - Advogado e professor de Língua Portuguesa do UniCEUB/ foto divulgação

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