EMPREENDEDORISMO
TECNOLOGIA A FAVOR DO
COMÉRCIO
Sabe aquele “Olá, senhor! Quer CPF na nota? ”, ou “É débito
ou crédito? ”. Essas frases podem estar com os dias contados. A verdade é que
os processos de consumo passam por mudanças constantemente. Se antes só se
aceitava dinheiro, agora temos os cartões bancários e se a ideia de realizar
compras por meio da leitura da íris do olho era só história de filme, hoje está
mais próximo do que se imagina.
A rede de fast food KFC iniciou em 2017, na China,
pagamentos por meio de reconhecimento facial do cliente, e isso, sem que seja
necessário abrir a carteira. E todo o processo é feito em uma tela tátil. Mas
não para por aí. Uma companhia área chinesa também utiliza essa tecnologia para
substituir o cartão de embarque do passageiro.
As possibilidades para aplicar formas de inovação no
comércio e serviços são diversas. Nos Estados Unidos, a Amazon lançou uma loja
sem caixa registradora em que o cliente retira das prateleiras o que deseja, e
assim efetua a compra sem precisar pegar fila, basta sair da loja com os
produtos que o desconto é feito no cartão de crédito cadastrado. Para isso, a
loja intitulada como Amazon Go, conta com câmeras e sensores para monitorar os
consumidores.
O professor de Marketing e da Pós-Graduação em Administração
da Universidade de Brasília (UnB), Rafael Barreiros Porto, faz uma análise
desse sistema e avalia se seria possível uma loja sem caixas aterrissar em solo
brasileiro. “Chegar ao Brasil é possível, a questão é que se vai dar certo, se
vai gerar ao empresário algum tipo de benefício rentável de negócio e não
apenas um custo. Isso porque o tipo de tecnologia que a Amazon implantou é
recente e passou por testes. Algumas coisas deram errado, como por exemplo, uma
criança que alterou a posição dos produtos, dificultando o processamento das
vendas”, contou.
O especialista aponta que é necessário que haja treinamento
com os clientes antes de implantar tecnologias que envolvem o processo de
compra. “Quando pensamos em trazer uma tecnologia de fora, ainda mais
tecnologia de varejo, se for implementada de uma forma radical implica em uma
mudança repentina do comportamento do consumidor. Portanto, se vier ao Brasil o
consumidor teria que passar por um treinamento para se habituar. E assim, o
empresário poderia analisar se o cliente voltaria ao estabelecimento para
executar aquele tipo de processo novamente. Isso porque essa tecnologia altera
o processo de compra e não a compra em si. E isso implica em uma série de
equipamentos, como câmeras para se certificar se o cliente comprou todo aquele
conjunto de produtos naquela loja e naquele dia e horário específico, pois
fraudes são possíveis”, ponderou.
// Emprego
Caixas sem atendentes, lojas sem vendedores, mas para aonde
vai toda essa gente? Ficarão desempregados? Será que algumas profissões que
temos hoje desaparecerão? O fato é que se um profissional é substituído por uma
máquina, a vaga deixa de existir. De acordo com o estudo realizado durante o
Fórum Econômico Mundial de 2018, as evoluções tecnológicas prometem acabar com
sete milhões de vagas de emprego até 2021.
Nesse cenário, 52% de mulheres serão dispensadas e os homens serão 48%
do total.
Para o professor Rafael Barreiros Porto, é importante que o
processo de mudança seja feito com cautela e gradualmente. “Não podemos
esquecer de toda a parte trabalhista que seria afetada pela tecnologia. Trocar
uma pessoa por uma máquina vai gerar o desemprego. Isso porque as pessoas ainda
não têm condições para aprender uma coisa nova e poder ganhar dinheiro. Por
outro lado, poderiam surgir novas formas de profissionalização focadas no
futuro. Mas isso claro, se não for feito em larga escala e de uma vez só”,
ressaltou.
Além disso, segundo o relatório do Fórum Econômico Mundial é
muito provável que as crianças do Ensino Fundamental de hoje vão atuar no
futuro em profissões que ainda não existem. E o fato é impulsionado pelos
avanços tecnológicos, nos quais as ocupações extintas serão trocadas por outras
que estarão relacionadas a novas formas de negócio.
Para o professor, os robôs ganharão mais espaço nesse
cenário. “Muitas profissões podem ser substituídas por robôs. A área de
robótica tem avançado. Um exemplo que já podemos ver são as profissões ligadas
ao trabalho doméstico, muito robôs surgiram para auxiliar e tornar mais prática
as atividades do lar. Olhando para o comércio, um vendedor poderia ser
substituído por algum mecanismo assim. Porém, a interação com o cliente seria
limitada, mecânica e impessoal, o que pode ser bom para algumas pessoas, para
outros consumidores não”, esclareceu.
Entretanto, não é só a mão de obra que será impactada, mas
também a cultura e a forma de consumir. Enquanto em muitos países desenvolvidos
é o próprio cliente que abastece e paga pelo combustível, por exemplo, no
Brasil temos o frentista e às vezes até um caixa. “Aqui se opta por ter
atendente em decorrência de uma série de condições, dentre eles a lógica
econômica. Se o empresário quiser trocar o empregado por uma tecnologia isso já
é um custo imediato grande, mas que se elimina ao longo do tempo. Mas supondo
que ele aceite fazer isso, seria uma mudança radical que provavelmente ele não
esteja disposto a arcar. Outro ponto é a questão cultural de que o brasileiro
já se acostumou a ser servido”, finalizou Rafael.
// Inédito
Bem perto daqui o grupo Via Varejo abriu em dezembro de
2017, em Aparecida de Goiânia (GO) uma loja denominada Smart das Casas Bahia. O
modelo apresenta uma maior aproximação entre os ambientes físico e online. Nele
é possível que os clientes acessem os catálogos de produtos sem que estejam
expostos fisicamente, tudo por meio de uma tela touchscreen.
O novo modelo conta com wi-fi gratuito de banda larga para
facilitar o acesso streaming de TV’s Smart, smartphones e games. As unidades
também possuem antenas que se comunicam com um software de mapa de calor. Lá
ficam armazenadas informações sobre a circulação dos consumidores que estiverem
com o wi-fi do smartphone ligado, gerando mais informações sobre as compras.
Segundo o diretor de Modelo de Vendas da Via Varejo, Marcelo
Nogueira, a novidade é para atender as novas demandas de consumo. “O formato
Smart oferece uma experiência de compra aos clientes com maior integração dos
ambientes online e físico, aumentando ainda mais as possibilidades para Retira
Rápido, que é a compra no site para retirar na loja, atendendo a um
comportamento de compras cada vez mais multicanal”, revelou.
Até o final deste ano o modelo deve chegar a aproximadamente
70 lojas em todo o Brasil. E a proposta traz lojas 25% menores. “No antigo
formato, precisávamos de unidades fisicamente grandes, fazendo com que
buscássemos, geralmente, regiões maiores para que garantíssemos rentabilidade.
Agora, com o modelo smart, poderemos implementar lojas mais enxutas e assim
aumentar a presença de lojas no Brasil”, afirmou Nogueira.
No Distrito Federal,
a rede McDonald’s iniciou em meados de 2017 uma modernização dos restaurantes,
seguindo um planejamento nacional. Na capital federal, três unidades do
Aeroporto de Brasília ganharam uma novidade. Por meio de um totem digital, os
clientes podem realizar o pedido de uma refeição e ali mesmo pagar pelos
produtos. Depois é só retirar no balcão. Além disso, é possível acrescentar
mais ingredientes ou retirar montando um sanduíche de maneira personalizada.
De acordo com o diretor de Comunicação Corporativa da Arcos
Dourados, que representa o McDonald’s no Brasil, David Grinberg, ter caixa
registradora ainda é preciso, mas as mudanças são necessárias. “A figura do
atendente ainda é muito importante no nosso negócio e isso não deve mudar por
um bom período. A ideia não é substituir os atendentes, mas sim oferecer mais
opções. Os funcionários, inclusive, auxiliam e estimulam que o cliente utilize
os totens. O que o McDonald’s apresenta, faz parte desse movimento de
modernizar os restaurantes. E trazer novas formas de atendimento é basicamente
o alinhamento com as demandas de consumo”, afirmou.
Para David, a mudança é uma adequação que segue o processo
evolutivo. “A conveniência é muito importante na sociedade moderna, as pessoas
têm cada vez menos tempo. E tendo em vista que o McDonald’s atende cerca de 2
milhões de consumidores por dia no Brasil, isso nos dá muita informação do que
eles querem, das necessidades e dos desejos de consumo. Entendemos que hoje em
dia as pessoas querem ter o controle da maneira de como fazer o pedido do que
vão comer. E o que estamos colocando para os clientes são opções. As pessoas
podem fazer o pedido pelos terminais de autoatendimento, mas também tem gente
que prefere ir ao caixa e ter aquela relação interpessoal com o atendente”,
explicou.
O diretor também faz também uma avaliação do novo sistema.
“O recebimento do público tem sido acima das nossas expectativas, o volume de
pessoas usando os terminais de autoatendimento em Brasília chega a 40%. E isso
é muito satisfatório. As pessoas hoje em dia que vão ao aeroporto já utilizam
terminais similares em outros locais e a adesão foi natural”, acrescentou.
A fotógrafa, Isabel Whitaker, que realizou uma compra no
restaurante, gostou da novidade. “É fácil e rápido fazer um pedido pelo
terminal porque é auto instrutivo. Eu acredito que isso só tem a crescer no
Brasil, pois facilita a vida. Ainda mais no aeroporto onde tudo é mais
corrido”, contou. O publicitário Gabriel Moreira confirma a praticidade. “Fiz o
pedido para três pessoas e não levei nem um minuto, foi bem prático”, garantiu.
Mas não são só os adultos ficam tentados a utilizar o
terminal. Cada vez mais habituados com a tecnologia, as crianças já conhecem
muito bem as telas digitais. A pequena Ariasha Reis Costa, de três anos, achou
divertida a experiência de pedir um milkshake usando os dedos. “Eu gostei de
tocar na tela. Foi bem legal poder escolher. Toda criança pode fazer isso
também”, contou.
O modelo do McDonald’s chamado Conceito, deve chegar a todos
os estabelecimentos do Brasil até o final de 2019. “Para esse formato otimizado
estamos fazendo um investimento considerável na ordem de R$ 1 bilhão durante o
ciclo de 2017 a 2019. Além dos totens trazemos mais interatividade com mesas
digitais e as pessoas também vão poder controlar o volume do som ambiente. Mas
é um processo de expansão que está ocorrendo e no seu momento os demais
restaurantes do Distrito Federal serão adequados a esse formato”, concluiu.
Mas no Aeroporto de Brasília não é só no McDonald’s que é
possível ter acesso ao autoatendimento. Sem precisar ir ao balcão, a advogada
Ana Carolina de Freitas, opta por fazer o check-in em um terminal. “É muito
mais prático usar o terminal, ainda mais quando o aeroporto está muito cheio
porque por enfrentar uma fila já perdi voo. Isso poderia ser incorporado em
outras áreas também”, opinou.
Segundo o diretor de Operações da Inframerica, empresa que
administra o Aeroporto de Brasília, Juan Djedjeian, a expectativa é que
serviços assim se estendam para outros segmentos, além do check-in e do
estacionamento. “A automação de serviços prestados aos passageiros e clientes
de terminais aéreos já é uma tendência mundial. Diversos aeroportos da Europa e
da Ásia utilizam sistema de despacho de bagagens automatizado, por exemplo.
Sistemas assim devem ser implementados no Aeroporto de Brasília em breve, pois
se mostraram ferramentas eficientes. Com o redesign do aplicativo para sistemas
iOS e Android, a experiência no aeroporto será mais moderna e aprimorada desde
o check-in até a decolagem. Com a automação de serviços, podemos, por exemplo,
melhorar a pontualidade do terminal”, assegurou.
Visão das empresas
Há quatro anos o Brasília Shopping oferece duas opções para
o pagamento do estacionamento: em um caixa físico e em um totem de
autoatendimento. Segundo a gerente de Marketing, Renata Monnerat, 75% dos
clientes escolhem pagar no totem. “Vemos cada vez mais as pessoas usando dessa
ferramenta que é ágil e prática. O serviço está presente nos quatro shoppings
do grupo e todos têm um alto índice de participação, pois reduz muito o tempo
da fila física. A nossa expectativa é que em um ou mais dois anos ele
represente até 85% dos pagamentos nessa modalidade até porque a cada dia se
utiliza mais o cartão em vez do dinheiro”, revelou.
Renata acredita que o modelo que traz mais independência ao
cliente é uma tendência mundial e só tende a crescer e se expandir para outras
áreas. “Acredito que essas facilidades por meio da tecnologia sejam estendidas
para as lojas. A compra física ainda é mais forte, mas a praticidade
tecnológica vai aumentar. Fora do Brasil é muito comum, mas para chegar aqui
não será complicado. Eu enxergo muitas mudanças nos próximos cinco anos. Penso
também que não vai demorar para que não seja mais necessário levar a carteira
para os lugares. Com isso, até a clonagem de cartões pode diminuir”, prevê.
Segundo o analista de Marketing da rede de supermercados
Dona de Casa, César Kazuo, apesar de contar apenas com caixas registradoras,
ele não elimina que no futuro possa implantar modelos de autoatendimento. “Não
descartamos a hipótese de estudar isso para o futuro. Mas toda grande mudança
precisa de tempo para dar certo, se adequar aos costumes e realidades do nosso
mercado. A experiência autônoma de compra pode ser sim um grande sucesso, mas
não podemos desconsiderar a qualidade de atendimento pessoal”, ressaltou.
Modelo viável
Quando pensamos nos modelos futurísticos de comércio
implantados pelos orientais e americanos a dúvida que fica é: é possível que
chegue ao Brasil? De acordo com o consultor em Gestão Empresarial e que possui
uma empresa que produz softwares, Alécio de Oliveira Silva, a tecnologia já
está à disposição dos brasileiros, os desafios estão na adesão e na confiança
de colocar em prática. “É totalmente viável instalar novos formatos em diversas
áreas no Brasil. Mas o grande problema em supermercados, por exemplo, é a
questão da ética do cliente, como registrar e pagar por apenas um produto, mas
colocar na sacola dois”, alertou.
O especialista ressalta que para que o modelo da Amazon vire
realidade no Brasil, é necessário contar com um sistema de monitoramento. “Se
você colocar um sistema de câmera bem montado acho que o maior desafio será
sanado. É preciso apenas adequar o formato americano ao cenário brasileiro. A
princípio poderia começar com máquinas de cartões e depois inserir a opção de
dinheiro. Não vejo necessidade de grandes mudanças em softwares, seriam mais
mudanças de hardware, ou seja, nos equipamentos, com adaptação para fazer a
contagem do dinheiro em moeda”, ressaltou.
Segundo Alécio tecnologia de ponta está ao dispor dos
empresários. “Hoje temos tecnologia de leitura da íris e para alinhar isso com
cadastros de clientes seria fácil, como por exemplo, dizer que o consumidor tem
crédito. E isso vai trazer mais segurança contra fraudes de identidade. A
tecnologia já existe no mercado e fazer sair do papel é mais uma questão de
adequação. Não está nada longe. Em um supermercado, basta mudar o layout dos
caixas, instalando balanças de pesagem com leitor de códigos, além das formas
de pagamento. Por isso, não vejo desafios em questões de automação”, concluiu.
Por Daniel Alcântara – Fecomércio - Publicado 15 de Março de 2018
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