ARTIGO / COLABORAÇÃO
Inevitavelmente que o grande encontro das duas primeiras matrizes que
formam o povo brasileiro - índios e portugueses – se chocou em suas visões
antagônicas e suas culturas tão díspares, ensejando a desconstrução étnica, que
é a nossa marca indelével.
A visão de se encontrar uma humanidade adâmica instiga,
vertiginosamente, os portadores da cruz de Amalfi ou cruz de São João. Símbolo
da ordem dos cavaleiros Hospitaleiros ou Ordem de Malta, ordem militar cristã, o
símbolo da cruzada na qual o Rei de Portugal, na época, era adepto.
Contrapondo-se à visão do novo mundo os índios tinham sua fé na Deus
Maíra e acreditavam na terra sem males. Tinham uma concepção mística, pois
praticavam o exercício contínuo da contemplação, que se entrelaçava no
perfeccionismo exacerbado de suas existências.
O conflito inevitável deu início a um verdadeiro massacre. A dizimação
e a desconstrução étnica produziram juntamente com a outra matriz formadora - africana
- o que hoje é o povo brasileiro segundo a visão antropológica de Darcy
Ribeiro.
Obtemperava-se neste conflito “civilizatório” o destroçar-se das bases
sociais, a negação dogmática de crenças e a imposição forçosa e doutrinária de
uma nova cultura; a luta de classes em seu aspecto, mais do que econômico, se
sobrepunha em nosso processo colonial.
Esta hecatombe que se sucedeu expôs as vísceras de um antagonismo
entre: concepções do bem e do mal; virtude e pecado; valor e covardia;
civilização e barbárie.
Para os índios, incrédulos com o desmoronar de suas crenças,
enfrentaram além da guerra “civilizatória” uma guerra biótica mortal e
implacável, pois indefesos com as epidemias e pestes trazidas do novo mundo não
resistiram e morreram aos milhares.
Aquela vida tranquila de uma existência solidária onde a mulher
traçava um cesto com a perfeição de que era capaz, pelo simples gosto de
expressar-se em sua obra como fruto maduro de sua ingente vontade de beleza, onde
jovens adornados de plumas sobre seus corpos escarlates de urucum ou
verde-azulados de jenipapo se engalfinhavam em lutas desportivas de corpo a
corpo em que punham a energia de batalhas na guerra para viver seu vigor a sua
alegria, acabara.
O choque de visões e crenças enfim chegara à nova civilização norteada
pelos princípios da exploração escravagista e pela nova cruzada, que moldaria, séculos
adiante, o que seria o Brasil de hoje.
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