Saúde Mental / Terapia Comunitária Integrativa
A comunidade atenta ao autocuidado por meio das terapias comunitárias
Terapia Comunitária Integrativa reúne grupos para conversas gratuitas que facilitam o acesso a tratamento da saúde mental. A prática de abordagem psicossocial é aprovada pelo SUS
Desenvolvida pelo psiquiatra e
professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) Adalberto Barreto, em 1980, a
Terapia Comunitária Integrativa (TCI) envolve o cuidado com a saúde mental em
grupo, por meio da troca de experiências entre os participantes. De forma
gratuita, os gestores propõem a integração de saberes por meio de memórias
afetivas, cantigas e ações lúdicas. A atividade, considerada pelo Ministério da
Saúde uma abordagem psicossocial, é adotada em várias unidades de saúde
distritais, estaduais e municipais como forma de construção de redes sociais
solidárias e fortalecimento da saúde mental. O Distrito Federal possui diversos
grupos de apoio que se reúnem semanalmente para dialogar sobre os problemas
vividos e buscar soluções em conjunto.
A capital do país ganhou, em 18 de
março, mais 37 terapeutas comunitários integrativos. O grupo, junto desde março
de 2022, recebeu um certificado de formação nessa, que é uma das práticas
aprovadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com regularização da Associação
Brasileira de Terapia Comunitária (Abratecom). Em forma de roda, cada
participante da sessão é co-responsável pelo processo terapêutico individual e
coletivo. A partilha de experiências favorece o resgate da identidade, a
restauração da autoestima e a ampliação da percepção sobre a sociedade.
As etapas de formação foram
desenvolvidas pelo Polo Correnteza, com sede em Sobradinho, em parceria com a
Ação Social Caminheiros de Antônio de Pádua (AscapBsB), sediada no Setor O, em
Ceilândia. Após 240 horas de curso e 30 práticas das rodas de conversa, a
professora de séries iniciais do ensino fundamental, Érica Borges, 51 anos,
conta que amou a experiência, diferente do trabalho desenvolvido em sala de
aula. "É muito importante que viremos intermediadores para que todos falem
e sejam escutados. É um processo semanal de cura", comenta.
Segundo Érica, que atua na Paróquia
Bom Jesus dos Migrantes, em Sobradinho, a terapia comunitária integrativa
foi criada para ser uma prática de intervenção coletiva que visa criar e
fortalecer os laços sociais como um espaço de acolhimento que favorece a troca
de experiências entre as pessoas. "É uma forma de encontrar mais
possibilidades que te dão estratégias para sobreviver àquele problema, além de
um momento importante para saber que não é a única pessoa que passa por algo
ruim", explica a terapeuta de Sobradinho.
Dois lados
Paciente da roda desde 2020, realizada
no formato on-line, a secretária-executiva, Cristiani Vieira, 47, também
tornou-se terapeuta comunitária e aprendeu a ouvir os outros. Com quadro de
depressão e ansiedade, ela explica que ao escutar outra pessoa sobre as
estratégias para superar um problema, conseguiu refletir sobre a melhor maneira
de enfrentar os próprios desafios. "O que mais vemos são pessoas
entendendo que precisam se cuidar para, depois, cuidar do outro", analisa.
Cristiani, que também incorpora a
palhaça Pipoca em festas particulares há 33 anos, leva a alegria para as rodas
de conversa, realizadas todas as quintas-feiras. Para ela, é um encontro
totalmente diferente das experiências que teve com terapia comportamental e
psicanálise. "É outra realidade e me ajudou muito, porque o mais legal é o
aprendizado do autocuidado", complementa a secretária-executiva.
O morador de Sobradinho 2, Eduardo
Rios Costa, 41, também participou da formação. De aluno, tornou-se instrutor dos
usuários atendidos no Centro de Atenção Psicossocial para usuários de álcool e
outras drogas (Caps-ad), na cidade onde vive. Ele deu entrada no projeto em
abril de 2019 para se recuperar de um vício. Lá, conheceu o projeto da Ação
Social Caminheiros de Antônio de Pádua. "Aprendo muito, me reconheço na
história do outro, mas a importância mesmo é para a comunidade. É um lugar de
fala, escuta e compartilhamento, com ganho social que não tem como medir",
emociona-se.
Nesse período, Eduardo diz que voltou
a cursar o 9º ano do ensino fundamental, após 23 anos longe das salas de aula.
"Não tenho formação acadêmica, mas, no curso, me encontrei com psicólogas,
educadoras sociais e isso vem me ajudando na escola. Na última sexta-feira,
reparei a forma como um menino desenhava rápido, o que chamamos de pensamento
sistêmico, onde conseguimos perceber como a pessoa está. Ele disse ter
ansiedade e me agradeceu pela atenção", detalha.
Empoderamento
social
Para a coordenadora do projeto, Mirna
Almeida, 41, o curso é uma ferramenta política de empoderamento social que
constrói vínculo entre as pessoas. "A roda é para que a sociedade tenha
espaços gratuitos de acolhimento e de ouvir as dores da alma, porque nem todo
sofrimento precisa ser medicado. E os terapeutas cuidam da saúde emocional dos
outros, sem julgar e dar conselhos, porque, às vezes, o que é remédio para uma
pessoa é veneno para outra", avalia.
Mirna destaca que os terapeutas
comunitários também estão sendo beneficiados pelo encontro. "Durante o
curso, os alunos se transformam e veem como um marco divisor da vida deles
porque a experiência mexe muito com as questões internas. A roda é para
todos", enfatiza.
Zona rural
Os cuidados com a saúde mental também
chegam a quem mora no campo. Para isso, a Empresa de Assistência Técnica e
Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF) oferece cinco pontos de
encontro. São rodas de conversa em terapias comunitárias integrativas para
encontrar alternativas de melhora da saúde mental voltadas a um público que
mora longe dos serviços de saúde. "Uma frase que a gente fala é que, se o
corpo cala, a gente adoece. E quando a gente fala, o corpo sara", explica
a assistente social da Emater-DF, Maria Bezerra.
Na instituição, ela trabalha como
extensionista rural para resolver problemas dos pacientes como o relacionamento
com filhos, pais e companheiros, além de abordar questões relacionadas à
autoestima. "Como começamos em julho de 2022, retomando a vida fora de
casa, muitas pessoas tiveram perdas durante a pandemia da covid-19. Tivemos o
relato de que o marido era o provedor da casa, morreu pela doença e a mulher
não teve a oportunidade de falar da dor dessa perda. Ela não tinha falado para
ninguém", lembra.
Segundo a psicóloga e referência
técnica distrital de terapia comunitária integrativa no DF, Doralice Oliveira
Gomes, após a retomada das atividades presenciais, o luto pelas perdas de
parentes e a sobrecarga na vida pessoal e profissional influenciaram no aumento
de pacientes nas rodas de conversa. Ela acrescenta que as terapias on-line
vieram para ampliar o cuidado da saúde emocional. "Temos desde pacientes
com transtorno mental grave — que aprendem a se colocar em grupo, se comportar
e ter um diálogo interessante — a pessoas que ainda têm medo do contágio com o
coronavírus. Estamos fazendo um processo de readaptação", complementa.
Atualmente, Doralice atua em três
frentes: na Secretaria de Saúde (SES), em parceria com a Secretaria de Educação
e com a Universidade de Brasília (UnB). A cobertura vai desde a educação básica
até o ensino superior, com grupos fechados em presídios. "A terapia
comunitária é uma abordagem terapêutica que proporciona amadurecimento coletivo
e acolhimento do sofrimento. As pessoas não vão passar por diagnóstico, mas
para encontrar um espaço de partilha da história de vida", conclui.
Atendimentos
Polo Correnteza, de Sobradinho
Contato: (61) 99844-5304
E-mail: correntezaterapias@gmail.com
Instagram: @correntezaterapias
Zona rural (pontos da Emater)
Café Sem Troco (CFST), na Quebrada dos
Neris (QN), no Paranoá
Assentamento Pinheiral (Pinh), em São
Sebastião
Núcleo Rural Taquara (TQ), em
Planaltina
Vargem Bonita (VB), no Núcleo
Bandeirante
Núcleo Rural Catingueiro (CTG), em
Sobradinho
Contato: (61) 3311-9373 da Gerência de
Desenvolvimento Sócio Familiar (Gedes)
E-mail: gedes@emater.df.gov.br
Secretaria de Saúde do DF
Coordenação técnica de terapia
comunitária integrativa
Contato: (61) 3348-6191
Site: www.saude.df.gov.br/praticas-integrativas-em-saude
E-mail: terapiacomunitaria.ses.gdf@gmail.com
Fonte: Pedro Marra/CB - Correio Braziliense, Foto:
Minervino Júnior/CB/D.A.Press
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