ARTIGO - Usar a brincadeira como ferramenta pedagógica faz a diferença na vida do aluno
Usar a brincadeira como ferramenta pedagógica faz a diferença na vida do aluno
Escolas fogem do tradicional e apostam em abordagens diferenciadas para formar estudantes mais preparados
O ato de
brincar diante de um conteúdo acadêmico é tão importante e didático para uma
criança quanto uma aula elaborada com os mais avançados recursos tecnológicos.
Há décadas a psicologia já trata a brincadeira como uma forma de a criança
resolver conflitos, reproduzir modelos e se projetar no futuro, na vida adulta.
Mais recentemente as escolas não tradicionais, mas focadas em uma educação crítica,
têm apostado na brincadeira orientada por especialistas em educação como uma
ferramenta para formar estudantes mais criativos, imaginativos e, também,
racionais, sem que uma coisa seja antítese da outra.
Apostar na
brincadeira como ferramenta de educação e ensino é, inclusive, uma das maneiras
de contornar um problema crescente na educação e que vem merecendo, cada vez
mais, a atenção da comunidade científica: a medicalização da educação. Basta
uma busca rápida na internet para perceber a quantidade de teses e artigos
científicos que abordam o crescente uso de medicamentos para crianças,
adolescentes e jovens durante a vida escolar. É que muitas vezes, diante do
desafio de aprender conteúdos áridos, de maneira tradicional, a criança e o
adolescente são levados a um estado emocional estressante, que dispara gatilhos
que desencadeiam quadros de ansiedade, depressão, irritabilidade ou apatia,
entre outras síndromes.
Na avaliação
da pedagoga e pesquisadora na área de neurociências da aprendizagem, Denise de
Felice, quando a escola conteudista tradicional se depara com um estudante que
está além ou aquém do esperado, muitas vezes, ela encaminha a criança para uma
série de profissionais, como psicólogos e psiquiatras, em busca de auxílio para
que o estudante “entre no ritmo” da turma. Em boa parte dos casos os pais dessa
criança deixam o consultório com um receituário de medicação controlada nas
mãos. É um caminho, mas a depender da situação, pode não ser a melhor solução.
Aprender
brincando
Denise de Felice
é mestre em Linguística Aplicada e estuda as interseções entre educação e
neurociência, explorando como o cérebro aprende e assimila esse conhecimento
para enriquecer abordagens pedagógicas inovadoras. Ela explica que existe uma
estrutura no cérebro responsável pela sobrevivência. Quando o indivíduo se
sente ameaçado, segundo ela, o cérebro tem reação instantânea. “Ou a pessoa
congela, ou corre ou vai para cima e luta, para enfrentar o problema. Essas
três reações não passam pela área frontal do cérebro, onde são processados os
pensamentos de ordem mais elevados”, diz.
“Quando se
tem o brincar, ocorre o contrário, porque é prazeroso. O cérebro da criança é
preparado, equipado para brincar e com o brincar esse sistema límbico do
cérebro vai falar que não há ameaças”, explica. Segundo a especialista, quando
não se sente ameaçada, a criança aprende mais. “O cérebro é um órgão que adora
aprender brincando”, garante.
Segundo a
professora, as escolas que apostam na brincadeira como ferramenta de ensino conseguem
os melhores resultados para a criança e para a família, sobretudo, quando essa
aula com “brincadeiras” acontece em meio à natureza. “Quando a gente vem para
um sistema de educação em que o brincar é a chave fundamental para se aprender,
a maneira de trabalhar o conteúdo muda, e isso não quer dizer que não é uma
escola com conteúdo forte. Aliar as duas coisas é fantástico”, garante Denise.
O aprender
conteúdos fortes com brincadeiras, segundo a pesquisadora, que é diretora da
ONE School, escola bilíngue de educação infantil e ensino fundamental da Casa
Thomas Jefferson, fortalece o lado socioemocional da criança. “A aprendizagem
passa por aí. Quando o socioemocional vai se fortalecendo, essa criança tem
mais facilidade de aprender. Se a criança é desafiada, ameaçada, ela bloqueia o
processamento na parte executiva do cérebro. Quando traz o brincar, a criança
relaxa e se engaja”, ensina. A ONE School, destaca Denise, aposta neste tipo de
educação inovadora.
Em casa e
na vida
Se apostar
em uma escola onde a brincadeira é uma ferramenta de aprendizado faz a
diferença na vida de uma criança, ter uma família que brinca com os filhos é
fundamental; sobretudo quando se brinca na natureza. “E sem plásticos ou
botões”, pontua a professora. Um dos exemplos é o fato de uma criança poder
brincar com um graveto no parque e este graveto poder ser ou se “transformar”
no brinquedo que ela imaginar. E, nesse contexto, a tela, o celular, é a
antítese do que é saudável e estimulante, diz a professora.
De acordo
com Denise de Felice, quando se coloca uma criança em frente a uma tela, ela
imediatamente deixa de formar conexões neurais. Criança precisa de desafios,
segundo a professora. “Criança precisa aprender a pegar uma tesoura, picar
papel, lavar uma louça. Brincar com o filho é fantástico e se esse brincar
acontecer na natureza, ninguém segura essa criança. No chão tem gravetinhos,
folhinhas, coisas que caíram das árvores. Esse é o brinquedo não estruturado,
que pode virar qualquer coisa”, diz, ao lembrar que quando esse comportamento
familiar está em alinhamento com uma escola diferenciada, o resultado é um
profissional adulto diferenciado e preparado para qualquer desafio.
Fonte: José
Marcelo Santos jornalistamarcelo@gmail.com,
Fotos: Divulgação
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