Caio Bonfim: a marcha da superação
Caio Bonfim: a marcha da superação
Caio: uma história de superação e garra até a
medalha de prata
Em 2012,
antes da prova nas Olimpíadas de Londres, Caio Bonfim resolveu comer uma
singela maçã. Foi o suficiente para que enjoasse e acabasse não tendo daquela
vez na prova da Marcha Atlética o desempenho que gostaria e de fato esperava.
Terminou a prova apenas em 39º lugar.
Assim são
os esportes de alto rendimento. Qualquer detalhe a mais ou a menos interfere no
resultado. No fundo, é sempre uma história de superação. Superação a cada
prova, a cade decisão a ser tomada. Mas superação que cresce muito mais se o
atleta teve problemas de saúde na infância, se enfrentou preconceitos a vida
toda pela sua escolha esportiva, se mora e treina em uma cidade onde lhe faltam
os melhores equipamentos para o seu treinamento.
Essa é a
história que, com exclusividade, Caio Bonfim, o dono da medalha de prata na
Marcha Atlética das Olimpíadas de Paris, conta a reportagem.
Nascido em
Sobradinho, região administrativa do Distrito Federal, Caio é medalhista em
competições sul-americanas e já participou de diversos campeonatos
internacionais, incluindo Jogos Pan-americanos e Mundiais de Atletismo.
Do futebol à Marcha
O primeior
amor esportivo de Caio Bonfim foi o futebol, que praticou entre os seis e os 16
anos. Só veio a migrar para a marcha após ter se destacado em seu preparo
físico nos próprios treinos de futebol. Foi quando seus pais, que já eram
ligados à Marcha Atlética resolveram inscrevê-lo em uma competição profissional
com apenas 16 anos.
Era o
início da ascensão de Caio no tipo de corrida cuja regra básica consistem em
manter os pés sempre plantados ao chão a cada passo. É essa necessidade que dá
à essa corrida o peculiar rebolado do corpo. As vitórias após os 50 quilômetros
da marcha são uma trajetória impressionante para alguém que talvez pudesse ter
ficado sem sequer andar quando criança.
Quando Caio
tinha apenas 2 anos e 8 meses, foi necessária uma cirurgia para corrigir uma
complicação. Suas pernas se entortaram, e foi necessário um longo tempo e
intenso tratamento para corrigir o problema. “Felizmente, tive acesso a bons
hospitais e, principalmente, ao cuidado dos meus país, a quem sou muito grato.
Eles são fundamentais na minha história”, contou Caio à reportagem.
Rebolado
A superação
inicial da infância alternou-se mais tarde com o preconceito. Ao começar seus
treinamentos nas ruas de Sobradinho, Caio tornou-se alvo da falta de respeito e
da ignorância das pessoas
“Eu era
xingado na rua, mas tinha o apoio em casa”, conta ele. Para o atleta, isso foi
o suficiente. “Pior seria ter apoio na rua e ser xingado em casa”, brinca ele.
“Meus pais absorvem muita pancada por mim e isso me ajuda demais, são minha
base´´.
Família
Na sua
conquista mais recente em Paris, nas Olimpíadas em que o atleta conquistou a
medalha de prata, Caio pode levar sua família para torcer de perto e contou
sobre essa sensação. O pai de Caio, João Sena, já foi o seu treinador. Hoje,
quem o treina é sua mãe, Gianete Bonfim. Ambos também foram atletas da Marcha
Atlética.
“Me motiva
porque, se der tudo errado, o colo que eu tenho pra chorar é o deles” diz Caio.
“Quem vai me abraçar e ficar comigo”, continua. “Você olhar para o lado e ver o
pessoal que sempre te apoiou, é bom estar acostumado com isso, gosto de estar
com eles por perto, é um sentimento de total emoção”.
Caio Bonfim
dá mais detalhes da sua relação com seus pais.
“Eles
sempre foram muito liberais comigo. Nunca tive essa cobrança até porque sempre
fui um atleta muito focado, e meus pais sempre observaram isso. Então, nunca
precisaram me cobrar. Por eles serem super capacitados, a gente foi evoluindo e
tendo resultados juntos. “Muitas vezes as discussões são mais acaloradas, mas
existe muito amor envolvido. O nosso objetivo é o mesmo, nós queremos vencer, e
cada um sabe seu papel”, destaca Caio. “Ter pessoas perto de você que te amam e
confiam em você é sensacional. É um privilégio ser treinado pelos meus pais, e
eu sou grato ao esporte por ter me dado essa oportunidade de ser amigo dos meus
pais e vivenciar as minhas conquistas do lado deles”.
Investimento e visibilidade
Houve,
portanto, a superação pela saúde. Depois, a superação do preconceito. E,
finalmente, a superação pela falta de estrutura, reconhecimento e investimento.
“No Brasil, o único esporte em que primeiro se investe e depois se colhem os
resultados é o futebol. Nos demais esportes, é necessário vencer primeiro para
que, depois, quem sabem, venham os investimentos”, acusa o atleta.
Um exemplo
dessa situação é o próprio anúncio da reforma do estádio Agostinho Lima, onde
Caio treina em Sobradinho. Foi somente depois da medalha de prata em Paris que
veio o anúncio dos investimentos para melhorar a estrutura até agora precária
onde Caio Bonfim faz seus treinamentos.
O atleta,
porém, destaca 2016, quando aconteceram as Olimpíadas do Rio de Janeiro como um
divisor de águas na questão investimentos. Naqueles jogos, Caio terminou a
prova em quarto lugar.
“Depois de
Rio 2016, eu conquistei o respeito das pessoas. Fiquei em quarto lugar, mas
considero como uma medalha que eu tenho. Ela não está na prateleira, mas a
visibilidade que conquistamos naquele ano foi muito importante para o grupo que
nós temos, o “Caso” (Centro de Atletismo de Sobradinho)”. O Caso é um projeto
social de marchadores que hoje conta com mais de 20 atletas. “Hoje, eles
possuem uma liberdade e vontade de marchar na rua que antes não existia. Antes,
éramos motivo de piada. Então, essa conquista moral foi muito importante”.
Sobre a
parte financeira, Caio exaltou o apoio que recebe da Loterias Caixa e da bolsa
atleta oferecida pelo governo federal. Caio também tem o apoio das Forças
Armadas desde 2018.
Acredite e trabalhe!
Por fim, o
medalhista passou um recado para quem o acompanha e se inspira em sua
trajetória.
“Sonhe e
trabalhe. Acredite e trabalhe. Eu já fui várias vezes 20.º no mundo, 30.º no
mundo e sempre achei isso muito legal. Acreditar que eu pudesse ser prata nos
jogos olímpicos é um sentimento muito bom. Então, se você já descobriu seu
talento, essa é minha mensagem: trabalhe, acredite, vai pra cima e goste do
processo. Vai valer a pena”.
Por: Yan Vittor Souza/Correio da Manhã – Fotos: Divulgação
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