Cerrado - Mirtilo se adapta ao Cerrado e vira eldorado de pequenos e médios agricultores do Distrito Federal
Mirtilo se adapta ao Cerrado e vira eldorado de pequenos e médios agricultores do Distrito Federal
Sucesso de algumas variedades da fruta, conhecida como blueberry, anima produtores e conta com incentivos públicos
O mirtilo é rico em elementos que conferem o
potencial para controlar o colesterol ruim, além de prevenir diferentes
doenças, inclusive alguns tipos de câncer
Docinho,
suculento, saudável e famoso no hemisfério norte. O mirtilo, mais conhecido
pelo nome blueberry, em inglês, é uma fruta
vermelha, embora de tom azulado, que aos poucos vai conquistando o gosto dos
brasileiros.
Cum um
clima bem diferente do encontrado no hemisfério norte, onde o mirtilo se
popularizou, o Cerrado tem se provado um local favorável ao cultivo da fruta.
Nos últimos anos, especialmente após 2022, o número de produtores disparou
no Distrito Federal e também em outros estados próximos,
fincando raízes para viabilizar um polo forte de abastecimento da fruta ao
mercado nacional e até externo.
Mesmo ainda
incipiente, o mercado de mirtilo teve um boom relativamente rápido devido ao
seu potencial de rentabilidade do cultivo, tendo as primeiras experiências mais
relevantes no Brasil nas regiões Sul e Sudeste. Atualmente, o Distrito Federal
tem mais de 2 mil mudas plantadas em 2,5 mil metros quadrados, e isso apenas
considerando as cooperativas apoiadas pela Empresa de Assistência Técnica e
Extensão Rural (Emater-DF), do
governo distrital.
As metas
são ambiciosas: chegar a 48 toneladas de mirtilo já em 2025 somente no DF, a
partir de uma variedade resistente ao calor desenvolvida pela Universidade da
Flórida, nos Estados Unidos, chamada "Biloxi". Até o momento, a maior
parte da produção ainda é consumida na região, mas a expectativa é criar
condições para iniciar uma guinada na exportação brasileira de frutas.
De acordo
com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a
exportação frutícola chegou a US$ 1,3 bilhão em 2023, cifra ainda pequena se
comparada a de alguns outros países sul-americanos. É o que aponta Luis
Marques, um português que preferiu investir no mirtilo na cidade de Buritis,
nordeste de Minas Gerais, e não em seu país de origem.
"O
Brasil é o terceiro maior produtor do mundo de frutas, mas é apenas o 23º
exportador do mundo. Vocês têm aqui um país vizinho que é o Peru, que há 12
anos não produzia nada em mirtilos e, hoje, produz e exporta cerca de US$ 1,5
bilhões ao ano, o que é mais do que o Brasil em todas as frutas", aponta.
Sua opção
pelo Cerrado brasileiro tem,
inclusive, um aspecto objetivo de produtividade, fundamental para a decisão de
imigrar há dois anos. "Em Portugal, a produção só começa passados três
anos do plantio, aqui é passado nove, dez meses. No primeiro ano de produção, a
média é a volta de 300 gramas, de 400 gramas por árvore e aqui é a volta de
700, 800 gramas por árvore".
Aparato
institucional e teórico
Vários
pesquisadores e universidades, junto à Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (Embrapa), participaram de estudos relevantes para a adaptação do
mirtilo ao calor brasileiro. Em Brasília, a principal referência e um grande
incentivador da adesão à fruta é o pesquisador Osvaldo Yaminishi, professor da
Universidade de Brasília (UnB), mas também há apoios institucionais.
Além da
Emater-DF, os produtores também contam com a Rota da Fruticultura, uma
iniciativa tocada pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco
e do Parnaíba (Codevasf) e que faz parte do Programa Nacional de
Desenvolvimento Regional, do Ministério da Integração de Desenvolvimento
Regional. Há um programa de acesso à crédito para compra de mudas e sementes,
além de outros investimentos estruturais, que são liberados seguindo alguns
critérios, como a exigência pelo que os cultivadores funcionem em formato de
cooperativas.
Leonardo
Frias, analista da Codevasf, diz que a companhia possui no currículo a bem
sucedida experiência com as uvas sem caroço. Por isso, promoveu estudos de
mercado e de agronomia para saber qual fruta "tipo exportação" seria
mais propícia ao Distrito Federal.
"De
todas as frutas vermelhas a gente escolheu duas para fazer o fomento aqui na
região: o açaí, que todo mundo conhece, e o mirtilo. Aqui, a gente consegue com
essas frutas ter valor agregado e produzir riqueza através da agricultura
familiar. Para você ter noção, um hectare de mirtilo equivale ao rendimento de
65 hectares de soja", comenta Frias.
Ele comenta
que o cerrado possui características "excelentes" para aumentar a
produtividade e até a qualidade das frutas. "O sol do cerrado dá a doçura
da fruta. E, com a irrigação e produzindo de forma profissional, você tem um
produto de alta qualidade, melhor do que os maiores exportadores do mundo, que
são o Peru e a Argentina", exalta.
Experiências
e boas práticas de cultivo de frutas vermelhas foram debatidas no dia 3 de
setembro durante o Berry Day, evento que ocorreu durante a Expo Abra de
Brasília. Durante uma manhã e uma tarde inteira, especialistas e agricultores
apresentaram e debateram boas práticas específicas às frutas vermelhas, além de
trocar soluções e planos mais ambiciosos, como instalar placas fotovoltaicas
nas plantações.
Benefícios
à saúde ainda estão sendo mapeados
Tereza da
Silva Ferreira é uma agricultora de Sobradinho, região administrativa de
Brasília, que aderiu ao mirtilo em 2022 e já possui planos de expandir sua área
cultivável e aderir à novas tecnologias. Animada com o incremento na renda
familiar, ela só foi conhecer a frutinha em 2022, através de uma recomendação
médica feita ao marido.
"O
médico que estava tratando o meu marido recomendou que ele ingerisse de 100 a
130 gramas por dia, porque as propriedades eram benéficas. Aí eu fui pesquisar
e acabei descobrindo uma porção de coisas", relata Tereza, que diz ter se
tornado uma pesquisadora assídua de publicações científicas, que sua filha
ajuda a traduzir do inglês.
Com
praticidade, Tereza consegue cuidar das suas atuais 460 mudas de mirtilo e
ainda elaborar produtos artesanais da marca Casa do Mirtilo DF, vendidos na
internet ou em feiras. A produção de mirtilo num viveiro de 70x3 metros não
ocupa parte significativa do terreno dela – e ainda sobra espaço para investir
em outras culturas, como o maracujá doce, o que é até recomendável, conforme
atesta Leonardo Frias.
"O
pequeno produtor não precisa deixar aquilo que ele produz. Tanto é que os
maiores beneficiários do nosso programa são programas de assentamento, ou seja,
pessoas que já têm a cultura local, às vezes tem o extrativismo de baru e
pequi, por exemplo. É possível fazer o consórcio da agrofloresta na produção,
ou aproveitar a infraestrutura de irrigação da produção de mirtilo ou de açaí
para produzir outras culturas", afirma.
Assim como
os demais agricultores, Tereza torce pela ampliação do consumo e do acesso às
mudas de mirtilo dentro do país. Através da sua marca, ela dá vazão à produção,
que é comercializada em feiras ou sob encomenda, in natura, como geleia, bolos,
sucos ou outros produtos.
"Cada
pé normalmente nos dá de 800 gramas a um quilo e pouquinho de mirtilo. Em toda
a safra mesmo, quando está na safra, a gente tira de 20 a 30 quilos de mirtilo.
Até preciso congelar uma parte para poder vender ou usar depois", comenta
a agricultora, que também vislumbra o momento que a fruta deixe de estar
restrita às classes mais altas. "Eu acho que é bom que a gente consuma
mais e que também caia ao preço, mais gente produza e o consumo seja mais
aberto para todas as classes sociais."
"Eu
acho que é uma fruta que merece estar na nossa casa. E já que no Brasil ela se
deu tão bem, tão doce, então eu acho que é quase que uma obrigação nossa, cada
um ter um na sua casa, com todas essas propriedades que ela nos traz",
encerra.
Fonte: Alex Mirkhan- brasildefatorj.com.br– Foto: Alex Mirkhan/BdF, Edição: Thalita Pires
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