Arte, Cidadania e Diversidade, Cultura, Destaque - Fazer grafite está cada vez mais caro, mas são os artistas periféricos que mais produzem, diz artista de Sobradinho

Fazer grafite está cada vez mais caro, mas são os artistas periféricos que mais produzem, diz artista de Sobradinho 

Nics SDN enxerga o movimento como uma forma de trazer visibilidade e oportunidades para a população periférica

Artista de Sobradinho (DF), Nics SDN. Crédito: Acervo Pessoal

 

Nascida e criada nas quadras de Sobradinho, a artista visual Nicole Torres, conhecida como Nics SDN, acredita que “a arte muda o cotidiano, o olhar, e transforma um muro sem vida em um espaço de comunicação, afeto e reflexão”. Para ela, o grafite e o hip-hop “são uma forma de ocupar, reivindicar, embelezar e de também resistir”.

 

Nics SDN denuncia que “atualmente os artistas urbanos possuem alguns incentivos aqui e ali (via programas de fomento), mas ainda falta muita coisa. Faltam reconhecimento real do poder público, investimento contínuo e acesso facilitado para quem está na base. O grafite está cada vez mais caro de fazer, e é ironicamente a periferia que faz e é a periferia que mais é impactada”.

 

A conexão entre a arte urbana e a rotina das pessoas é mais impactante do que parece. O encontro das intervenções culturais com o cotidiano é sutil.

 

Às vezes, quase imperceptível.

Ao passarem por obras de grafite todos os dias, ainda que não percebam, as pessoas são transformadas por essas mensagens e expostas a vozes que, de outra forma, seriam silenciadas.

 

“O grafite surgiu como uma forma de resistência e continua sendo até hoje. É a voz de quem muitas vezes é silenciado. A intervenção urbana chega em lugares onde o Estado não chega, onde o Estado não alcança”, avalia Nics. 

Amor: grafite no ponto de ônibus da artista Nics SDN. Crédito: Acervo Pessoal

Denúncia

Apesar da presença marcante do grafite no DF, o reconhecimento institucional ainda é tímido. A professora de arquitetura Maria Fernanda Derntl, da Universidade de Brasília, destaca que não há um único significado para intervenção urbana e que esse tipo de arte, por sua natureza, é frequentemente visto como polêmica.

 

“Algumas intervenções são mais aceitas, outras não. Existe até legislação que associa esse tipo de manifestação ao vandalismo. Mas é uma discussão importante sobre o que é ou não considerado arte e até onde vai o direito das pessoas de intervir na cidade”, afirma.

Desafios específicos

Brasília, por seu traçado modernista e planejamento rígido, impõe desafios específicos para artistas urbanos.

 

“Não é uma cidade tão murada quanto outras, como São Paulo. Por isso, é preciso aproveitar criativamente o que a cidade oferece”, diz a professora.

 

Ainda assim, iniciativas públicas tentam controlar o grafite por meio de editais e temas predeterminados o que, para artistas como Nicole, acaba por limitar a liberdade criativa e o poder de denúncia que a arte urbana carrega.

 

Presença

A grafiteira enxerga o movimento como uma ponte para espaços que a população em situação de vulnerabilidade teria dificuldade de acesso. É uma forma com que possam se expressar com maior potência, além de oferecer incentivo para outras perspectivas e alcance para o senso de pertencimento.

 

“As vivências na quebrada me construíram e querendo ou não a gente cresce sem incentivo nenhum para estudo, para criar, para sonhar, para cultura, para nada. E aí, quando eu conheci o grafite, eu vi um movimento que potencializa a nossa visão de mundo, que incentiva a gente”, conta.

 

Nics SDN realizando grafite no DF. Crédito: Acervo Pessoal

 

Nicole defende a importância tanto do grafite quanto do hip-hop para o cenário cultural periférico brasiliense.

 

“O grafite e o hip-hop são políticos porque mostram que a gente está aqui, vivo, criando, resistindo. Não dá para ignorar a força do entorno, da nossa arte, do nosso direito à cidade. Então, mesmo sem o devido reconhecimento, a gente segue ocupando esses espaços, pintando muro e construindo, fazendo essa história acontecer”.

 

Fonte: Agência CEUB / Maria Clara Abreu e Maria Eduarda Fava,Sob supervisão de Luiz Claudio Ferreira

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