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IPÊS E HAICAIS

*Geraldo Lima

Não me canso: acompanho sempre, extasiado, a floração dos ipês. Este ano, então, eles deram um show. Foi um espetáculo de encher os olhos. Em Sobradinho, foi possível flagrá-los nesse estado de poesia e graça em vários lugares. Na Quadra 14, por exemplo, um ipê-branco, solitário à beira da pista, floriu e refloriu umas três ou quatro vezes. Quando se imaginava que o seu espetáculo já havia acabado, que se cerrariam as cortinas, eis que ele, tal qual um mágico sacando flores da cartola, nos surpreendia ainda em meio às palmas e cobria-se de novo de branco. E mesmo depois, cobrindo-se já de verde, insistia numa tênue floração. Na Quadra Central, outro ipê-branco, espremido entre o asfalto e o comércio, ornando a pressa dos passantes, repetiu a mesma performance. Na Quadra 13, um ipê-amarelo capturava nosso olhar pela exuberância da sua floração. Na área verde, seu amarelo intenso se destacava acima das casas. Impossível era não enxergá-lo de longe e não se deixar atrair pela beleza da sua copa dourada. (Em seu curto período de governo, o ex-presidente Jânio Quadros, entre uma esquisitice e outra, fez bonito ao escolher o ipê-amarelo como a flor-símbolo do Brasil.).

Tomado pela magia dessa floração em série, do ipê-branco ao ipê-rosa, em meio à seca que assola o Distrito Federal, compus dois haicais tendo o ipê-branco e o ipê-amarelo como tema. Para quem não sabe, o haicai é um poema de origem japonesa, caracterizado pela concisão e pela objetividade. O haicai clássico (ou haiku, no Japão) obedece a uma forma fixa: o primeiro e o terceiro versos possuem cinco sílabas poéticas, e o segundo, sete. Mas, dependendo do poeta e do lugar, essa regra não é seguida. Nem mesmo a referência à natureza ou às estações do ano é observada. Eu, particularmente, componho os meus haicais seguindo a métrica clássica e mantendo a ligação com a natureza. Sou, desse modo, bem tradicionalista na confecção dessa pequena joia poética. No Brasil, quem popularizou o haicai foi o poeta Guilherme de Almeida. No Japão, entre os muitos haicaístas (ou haijin) que se destacaram, encontra-se Matsuô Bashô (1664-1694), “que se dedicou a fazer do haikai uma prática espiritual”.

Bom, caros leitores e caras leitoras, para lhes encher os olhos e inundar-lhes a alma de beleza e poesia, seguem aí os dois haicais que compus e os ipês que fotografei na Quadra 14 (ipê-branco) e na Quadra 13 (ipê-amarelo).

a seca medonha
e os ipês-brancos florindo
num jardim de cinzas


ipê-amarelo
diante dele,florido:
Van Gogh em delírio


(*)Geraldo Lima é autor dos livros A noite dos vagalumes (contos, Prêmio Bolsa Brasília de Produção Literária, FCDF), Baque (conto, LGE Editora/FAC), Nuvem muda a todo instante (infantil, LGE Editora), UM (romance, LGE Editora/FAC) Trinta gatos e um cão envenenado (peça de teatro, Ponteio Edições) e Tesselário (minicontos, Selo 3x4, Editora Multifoco). É colunista dos sites O BULE www.o-bule.com e Portal Entretextos: www.portalentretextos.com.br Colabora com o Jornal Opção, o Jornal de Sobradinho e a Revista TriploV: www.triplov.com Bloga ainda em: www.baque-blogdogeraldolima.blogspot.com email:gera.lima@brturbo.com.br Twitter: @gerassanto.com

Um comentário

Larissa Marques - LM@rq disse...
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