ARTIGO JURÍDICO / COLABORAÇÃO...
Trabalho intermitente: uma
nova modalidade de contrato de trabalho e precarização da relação de trabalho.
A reforma
trabalhista introduziu no ordenamento jurídico brasileiro o chamado contrato de
trabalho intermitente, o qual garante que o empregado fique subordinado ao
contratante, ao mesmo tempo em que este tem o direito de utilizar de seu labor
de acordo com a sua necessidade.
O parágrafo
terceiro do art. 443 da CLT, dispõe que:
Considera-se
como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com
subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de
prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses,
independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto
para os aeronautas, regidos por legislação própria.
Com efeito,
o contrato de trabalho intermitente permitirá a prestação de serviços de forma
não contínua, com possibilidade de alternância de períodos de prestação de
serviços e de inatividade, não existindo nenhuma ressalva quanto à adoção do
trabalho intermitente, exceto para os aeronautas.
Esse também
é o entendimento exarado no dossiê do Centro de Estudos Sindicais e de Economia
do Trabalho (CESIT) - UNICAMP:
Conforme
previsto no projeto, esse contrato permitirá a prestação de serviços de forma
descontínua, podendo alternar períodos em dia e hora e, com isso, atender às
demandas especificas de determinados setores, com o respectivo pagamento proporcional
ao número de horas trabalhadas. A redação do texto deixa evidente que não
haverá nenhuma restrição à adoção do trabalho intermitente. Desta forma,
empregadores que prefiram remunerar seus trabalhadores apenas pelas horas
trabalhadas, ao invés de estabelecer uma jornada pré-definida de trabalho,
terão total liberdade para fazê-lo.
Verifica-se,
portanto, que a “adoção do contrato intermitente tem o propósito de se ajustar
às especificidades de cada segmento e, com isso, os empregadores poderão
utilizar-se de distintas formas de contratação conforme as suas necessidades”.
Para aqueles
que defendem a “reforma” trabalhista, a regulamentação do trabalho intermitente
nada mais é do que a regulamentação do “bico”, uma realidade já existente no
Brasil. Para eles a normatização desse tipo de contrato de trabalho dá
segurança a ambas as partes, bem como cria uma fonte de renda.
Para essa
corrente, essa modalidade contratual traz vários benefícios à classe
trabalhadora, como por exemplo: gera
novos empregos; cria oportunidade para o cidadão que está acessando o primeiro
emprego ou que precisa conciliar trabalho e estudo.
No entanto,
ao contrário do que sustenta essa corrente, não se vislumbra nenhum benefício
ao trabalhador, pois o contrato de trabalho intermitente tem um caráter
totalmente imprevisível e precariza a relação de trabalho. Ademais, o referido
“bico” nada mais é do que o trabalho informal e, portanto, um ilícito que deve
ser combatido.
A esse
respeito, assim explicita o dossiê do Centro de Estudos Sindicais e de Economia
do Trabalho (CESIT) - UNICAMP:
Essa forma
de contratação subordina o trabalho a necessidades eventuais do empregador. O
trabalhador e a trabalhadora ficam disponíveis 24 horas por dia e vinculados a
um contratante que poderá dispor de seu trabalho a qualquer momento pagando
apenas pelas horas trabalhadas. Não há nenhuma previsibilidade em relação ao
número de horas contratadas, nem à remuneração a ser recebida, o que produz
incerteza para o trabalhador, além de um forte impacto social, na medida em que
reduz as contribuições previdenciárias e os direitos trabalhistas.
Ressalta-se
que o contrato de trabalho intermitente é ainda mais perverso do que a adoção
da jornada móvel e variável, já ilícita, pois não assegura ao trabalhador sequer
a percepção do piso salarial previsto na norma coletiva aplicável, ou mesmo do
salário mínimo mensal.
Ademais, o
trabalho intermitente gera diminuição da remuneração, aumento da carga de
trabalho, bem como redução das horas pagas. Essa modalidade de contrato de
trabalho é totalmente calamitosa para o trabalhador, não lhe assegurando
condições de vida e de trabalho minimamente dignas, além de comprometer a sua
saúde física e mental.
Conforme
lecionam Mauricio Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado:
(...) não há
dúvida de que a nova fórmula jurídica poderá ter um efeito avassalador quanto
ao rebaixamento do valor do trabalho na economia e sociedade brasileiras. É que
ostentando essa fórmula uma amplitude bastante extensa (vide a generalidade da
regra constante do §3º do art.443 da CLT), ela tenderá a instigar os bons
empregadores a precarizarem a sua estratégia de contratação trabalhista tão
logo os concorrentes iniciarem esse tipo de prática.
(...) A
precarização instigada por esse instituto é tão evidente que o pagamento das
verbas é realizado no próprio dia da prestação de serviços.
De igual
sorte, Souto Maior afirma que “o trabalho intermitente regulamentado cria um
estágio tal de submissão que legitima toda forma de exploração do trabalho,
desprovido de tutela, afrontando cabalmente a condição humana dos
trabalhadores” .
Percebe-se
que a nova fórmula jurídica implica flagrante supressão de direitos e garantias
do trabalhador, em uma tentativa de desmantelar toda uma interpretação jurídica
já construída pelo Tribunal Superior do Trabalho e pela doutrina quando da
análise do sistema de jornada móvel e variável, que consegue ser superado em
termos de nocividade e perversidade ao trabalhador pelo contrato de trabalho
intermitente, como visto.
Por Valdilene Ângela de
Carvalho Guimarães (foto) ; Mestranda do Curso de Direito das Relações Sociais
e Trabalhistas do Centro Universitário UDF- Brasília – DF e Pós-Graduada
(Especialização) em Direito do Trabalho pela Faculdade Fortim (2008) e
Pós-Graduada em Direito Civil e Direito Processual Civil (2012) pela Faculdade
de Araraquara em parceria com o Instituto dos Magistrados do Distrito Federal –
IMAG/DF e Professora Universitária e Advogada e
e-mail:valdileneangela@hotmail.com.
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