ECONOMIA - População acima dos 60 anos busca mais espaço no mercado de trabalho
População acima dos 60 anos busca mais espaço no mercado de trabalho
O número de pessoas 60+ cresceu nos últimos anos. Porém, especialistas afirmam que muitos sofrem com o preconceito da idade. GDF oferece qualificação para quem quer se manter ativo, com projetos como o programa RenovaDF
Amarildo
Magalhães, 62, está na mesma loja há mais de três décadas
O Distrito
Federal registra um grande aumento da população de pessoas idosas. De acordo
com dados do Censo, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), essa população saltou, na capital do país, de 198.012 para
365.090, entre 2010 e 2022 — um aumento de 84,3%. Muitas dessas pessoas estão
ativas ou se sentem dispostas a continuar no mercado de trabalho, porém
esbarram em grandes desafios e barreiras.
Professora
do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB) e especialista em
envelhecimento humano, Isabelle Chariglione destaca que o envelhecimento
populacional é um fenômeno global e, no Brasil, não é diferente. "Alguns
estudos, inclusive, afirmam que, a partir de 2030, teremos mais pessoas idosas
do que crianças no país. Outros levantamentos indicam que isso já aconteceu em
2020", alerta.
Para
Isabelle, com o aumento das pessoas idosas na sociedade, consequentemente,
também tem uma perspectiva de crescimento dessa população no mercado de
trabalho. "A gente tem pessoas que, ao chegarem nos 60 , ainda se sentem
muito confortáveis com a saúde, cognitivamente muito aptas a realizar sua
atividade e elas querem se manter no trabalho", avalia.
Por isso, a
especialista acredita que o mais interessante é que elas continuem exercendo
suas funções, tanto homens quanto mulheres idosas. "Além da questão da
saúde, também podemos pensar no crescimento econômico do país e na própria
sustentabilidade da Previdência Social, pois quanto mais tempo as pessoas
continuem trabalhando, sentindo-se bem e tendo benefícios por isso, mais acabam
ajudando todo o sistema", pontua a professora da UnB.
Respeito
José
Venâncio Fernandes, 72 anos, (foto) está aposentado há 12 anos, mas continua
trabalhando como gestor de manutenção em um shopping. "Sou um apaixonado e
gosto do que faço. No começo, trabalhava como bombeiro hidráulico e, com o
tempo, fui subindo de cargo. A empresa me deu a oportunidade de criar meus
quatros filhos", afirma. "Não é uma relação boa, é ótima",
destaca José Venâncio. "Todos me tratam com muito respeito, desde a
limpeza até os chefes. Aqui, vejo como a minha segunda casa, uma família",
descreve.
Com orgulho,
mostra os prêmios que ganhou pelo seu trabalho. "Sou uma pessoa que,
apesar da idade, apresento resultado e aqui é um lugar onde percebo que não
existe preconceito por conta da idade", garante o idoso, ressaltando que,
enquanto estiver bem consigo mesmo e para a empresa, continuará trabalhando.
"Tenho exemplos de amigos que pararam e, pouco tempo depois, ficaram
doentes. Alguns, infelizmente, acabaram até falecendo", observa.
Amarildo de
Magalhães, 62, também é aposentado, mas trabalha como vendedor há 33 anos numa
mesma loja. "Comecei a trabalhar muito cedo e fui bem reconhecido por
isso. Minha relação sempre foi muito boa, tanto com clientes quanto com os
patrões", afirma.
O vendedor
destaca que teve problemas com o valor da aposentadoria e, por isso, teve que
voltar a trabalhar para aumentar o orçamento. "Tinha o reconhecimento da
empresa, então não tive dificuldades na hora de buscar a vaga novamente",
pontua. Ele comenta sobre os preconceitos que existem no mercado em relação à
idade. "Presenciei alguns casos, com amigos, muito pelo fato de serem mais
velhos e o atendimento ser lento, mas comigo, nunca aconteceu", ressalta.
Dificuldades
Os desafios
são grandes, de acordo com a especialista Isabelle Chariglione. "Temos uma
crença de que as pessoas mais velhas teriam menos capacidade e, com esse
pensamento, faltam oportunidades no mercado de trabalho", lamenta. Dados
mais recentes do Instituto de Pesquisa e Estatística (IPEDF) mostram que, entre
2021 e 2022, apenas 5,3% dos acima de 60 anos estavam na População
Economicamente Ativa (PEA). A diferença para a faixa etária de 30 a 59 anos,
por exemplo, é discrepante — enquanto 65,2% desse público estão na PEA.
De acordo
com a especialista, existe muita dificuldade para a adaptação das pessoas
idosas. "Cada vez mais o trabalho exige um ritmo acelerado, constantes
mudanças e isso, de fato, impacta negativamente naqueles que estão
envelhecendo", observa. Isabelle destaca os benefícios de estar
trabalhando, mesmo numa idade mais
avançada. "Para algumas pessoas, é muito importante, pois proporciona
autonomia, traz saúde mental e engajamento social, além de mantê-las ativas
mental e fisicamente", reforça.
Pensando
nisso, Juliana Seidl, 39, criou uma empresa, em 2017, para oferecer cursos,
programas e mentorias voltados para as pessoas mais velhas. A motivação,
segundo a empresária, veio da percepção de que a população tem baixa
perspectiva de futuro. "Boa parte, principalmente as classes mais baixas,
está pensando, primeiramente, em sobreviver. E mesmo aqueles que têm uma
condição financeira melhor não aprenderam na escola sobre o tema",
comenta.
Segundo a
empresária, a maioria das pessoas idosas que precisam continuar trabalhando
optam por empreender, para ter maior autonomia, flexibilidade e trabalhar com o
que gostam. Além disso, eles sabem que, podem não passar em processos seletivos
em função da discriminação etária. "Infelizmente, essa decisão pelo
empreendedorismo também ocorre por causa da falta de oportunidades de trabalho
voltadas para esse público. O nosso mercado de trabalho começa a ser excludente
já a partir dos 45 anos de idade e isso dificulta a recolocação profissional,
depois de um desligamento", pontua.
Interação
A professora
Isabelle Chariglione ressalta que o Distrito Federal tem uma das maiores
expectativas de vida e maior renda do país. "Então, a gente está 'virando
a chave', percebendo que teremos mais pessoas idosas e elas precisam permanecer
ativas, tanto por uma questão previdenciária quanto de sociedade, de vida e de
manutenção da independência desse público", salienta.
Para tentar
mudar a realidade das pessoas idosas no mercado de trabalho, a especialista
afirma que é preciso pensar, primeiramente, numa intergeracionalidade.
"Temos que ter pessoas mais jovens e mais velhas interagindo dentro do
mesmo espaço de trabalho", aponta. "Além disso, para combater esse
preconceito, são necessárias mais ações educativas para desconstruir esses
estereótipos que falam que quem está envelhecendo não deveria estar no mercado
de trabalho, mas, pelo contrário, valorizando a experiência dessas
pessoas", argumenta.
"Também
deveríamos pensar numa educação continuada, oferecendo cursos e treinamentos
para a equipe que faz parte daquele serviço, além de políticas públicas: o
governo tem que desempenhar um papel importante na promoção da inclusão dos
idosos no mercado de trabalho", opina.
Secretário
de Estado de Desenvolvimento Econômico Trabalho e Renda (Sedet-DF), Thales
Mendes Ferreira afirma que o governo está preocupado com o mercado de trabalho
voltado para o público idoso. "Temos as 15 agências do trabalhador
funcionando diariamente para o público em geral, e também as nossas
qualificações profissionais, que são voltadas para todas as idades, mas
percebemos um grande número de pessoas mais velhas participando", comenta.
De acordo
com o secretário, a pasta abre espaços para pessoas vulneráveis. "No
RenovaDF, o índice de pessoas idosas formadas é de 4%, enquanto no Qualifica DF
o percentual sobe para 6%, o que consideramos um bom número", detalha.
"Existe uma grande quantidade de pessoas acima dos 60 anos nas nossas
qualificações, mas o mercado de trabalho coloca um 'freio' e tem uma visão
errônea de que elas estão com a idade avançada", lamenta.
Fonte:
Alessandro de Oliveira/CB - Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira -
Correio Braziliense - Fotos: Alessandro
de Oliveira/CBPress
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